Chegou ao meu conhecimento que determinado
compatriota nosso, em Luanda, ofereceu aos seus leitores uma origem etimológica
de "pakulamento", termo usado para descrever a prática deliberada de
clarear a pele, a "mulatização" para muitos, que volta à baila na
sequência da adesão e publicitação que está a ganhar entre artistas
(intelectuamente ocos e na sua maioria do piorio que o nosso mercado musical viu nascer), mas também entre líderes religiosos e
políticos. Segundo a "notificação", o citado compatriota (de cuja
competência/desempenho na língua Umbundu em princípio não fazemos ideia)
defende que o calão "pakulamento" vem do Umbundu, do verbo
"okupakula", que no seu dicionário mental significa
"clarear". É possível que seja mas... até onde vai o nosso
conhecimento, o verbo "okupakula", também ele polissémico e com
presença na bíblia, tem dois sentidos, sendo um deles pestanejar e o outro
delatar/trair. A sua aplicação mais universal tem que ver com a parábola de
Judas que traiu Jesus, que em Umbundu é "Yuda wapakula Yesu". Eu, que
por acaso tenho andando pelas mais recôditas aldeolas da então "nação
ovimbundu" (Benguela, Huambo, Bié), não vi tais práticas de clarear a
pele, o que implicaria a relevância de os falantes do Umbundu arranjarem um
termo para tal. Já pela fronteira com os Congos é que se nota frequente o uso
do que é vulgarmente conhecido como "mekako", cujo significado
desconheço. Por exemplo, para quem passou a infância a assistir aos treinos da
Académica do Lobito e com isso conviver com os atletas de futebol, os que
"se pintavam" eram "langas" (termo depreciativo para os da
RDC). A não ser que no tempo de Judas e Jesus já houvesse necessidade de
clarear a pele para "cantar melhor", parece-nos a nós que uma
afirmação no sentido de "okupakula" ser significado de
"clarear", só pode ser um enquadramento etimológico algo forçado. No
mínimo, a estabelecer uma analogia, esta seria no sentido moral, onde clarear a
pele para adoptar padrões estéticos de beleza (biologicamente impossíveis)
representa trair a origem e a identidade de que se é parte, tese que aliás é a
base da repulsa do grande povo. Resumindo, até provas em contrário, os
ovimbundu não usam o verbo "okupakula" para o "pakulamento",
ou se calhar até usam, mas só no Facebook mesmo.
Gociante
Patissa, Katombela 20.08.15
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